terça-feira, 30 de março de 2010

Biografia IV


Ah! Estou feliz com as leituras que fiz. Terminei de ler esta semana: O Narrador e o Conceito de História de Walter Benjamin e também a A Idéia da Fenomenologia de Edmund Husserl. Obviamente essas leituras giram em torno da senhora Arendt. Depois de ler muitas das obras dela, senti necessidade de nadar pelo mar que a influenciou. Faltam ainda muitos autores, tais como: Marx, Heidegger, Spinosa entre outros. Mas aos poucos vou chegando em meu objetivo: ir desvendando e entendendo o pensamento de Hannah Arendt. Segue hoje a biografia e a continuação do comentário do artigo A Imagem do Inferno.

I – Biografia III

Sabemos que uma das obras mais originais é Ser e Tempo de Heidegger, que é considerado um dos, se não o maior, filósofo do século XX. Mas o que isto tem a ver com o amor de Arendt e Heidegger? Tudo! Foi exatamente nesse momento de intensa produção intelectual que Heidegger mostra a Hannah os primeiros esboços do que seria sua grande obra inacabada. Nessa primavera de 1925, que é o momento de intensidade, tanto espiritual, quanto amorosa que os dois irão trocar tudo aquilo que o mundo lhes apresenta: angustias, prazeres, conversas filosóficas... Hannah irá abrir seu coração pra Heidegger e esse, por sua vez, lhe dará a força necessária para que ela desabroche como uma intelectual.

É Hannah quem será a primeira interlocutora, leitora e certamente quem fará as primeiras correções nos artigos que Heidegger vai publicando e que um ano depois dará origem a Ser e Tempo. Eles leem Goethe, Hölderlin e saem em longos passeios. Hannah sente, nos primeiros momentos, vontade de ser totalmente de Martin Heidegger, mas este nem pensa em separar-se. (Uma pena que tenhamos somente a grande maioria das cartas que ele enviou pra ela, e não as que ela enviou pra ele, mas em: Hannah Arendt e Martin Heidegger, Correspondência 1925-1975. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2001,temos uma boa idéia de como era o teor da relação dos dois).

Nas correspondências encontramos a natureza representada pelas palavras dos dois. Natureza no sentido mesmo de verde, de lago, de passeios ao ar livre. Ela traz essa calma a para dele. Não podemos entender a presença de Hannah na vida de Martin apenas como uma simples amante. Ele nutre por ela um enorme respeito que, mesmo após dezenove anos sem se verem, continuará vivo e presente entre os dois. Existem muitas facetas desse amor que gostaria de citar aqui, mas o principal é entender que Hannah impregna e toma a vida de Martin em sua totalidade. Não, ele não pensa em separar-se, mas também não pensa em perder Hannah.

Muitos comentadores e mesmo biografistas afirmam que em Ser e Tempo encontramos ressonância do amor entre os dois. Jamais no sentido de resumir ou mesmo atribuir esse livro a Hannah. Mas simplesmente deixar claro que ela contribui para que Heidegger o escrevesse. A independência de Hannah, bem como seu orgulho, impressionam ao pensador. Ele toma Hannah como sua principal interlocutora, e não mais seu grande mestre Husserl.


II – Estudo Comentado

Comentário do texto: A Imagem do Inferno de Hannah Arendt. Parte II.
Segue a edição da editora Relógio D'Agua, citada anteriormente.

“É tão necessário punir os culpados como saber que não há castigo à medida dos seus crimes” (Compreensão e Política e Outros Ensaios. p. 120). Se para Arendt não há um castigo a medida dos crimes cometidos, existe, de outro lado, um certo distanciamento histórico necessário para que se possa compreender os fatos e assim dar-lhes tanto sentido como significado, para que, talvez, o próprio castigo para os crimes nazis possa ser aplicando dentro de novos e corretos parâmetros. Já que a própria natureza dos crimes é nova.

Se o chamado Livro Negro, a qual Arendt lança uma crítica feroz e construtiva, falha em pontos que ela considera capitais o livro de Max Weinreich é apresentado como um dos melhores guias da máquina de terror construída pelos nazis. Ainda sim, para Arendt, Max afirma certas questões discutíveis, tal como a de que “os cientistas alemães forneceram as idéias e as técnicas que conduziram a esse massacre sem par e o justificaram” (p. 121). Para Arendt os nazis tinham suas próprias idéias e precisavam de pessoas que as colocassem em prática. Por exemplo Heidegger que serviu ao movimento até certa altura e depois  fora dispensado quando colocou o nacional-socialismo como respeitável dentre os ilustres universitários da época.

O que podemos extrair desse pequeno e profundo texto de Arendt, é seu assombro frente ao totalitarismo. Ela se interroga como que uma criança frente a um novo acontecimento. É justamente aí que ela se diferencia dos autores de sua época que viam, em sua maioria, apenas mais um crime cometido contra judeus ao longo dos séculos. Outros aspectos, tais como a questão do terror e da natureza do movimento nazi, que poderiam ser citados neste breve comentário foram deixados a fim de me tornar mais conciso. Fica a indicação da leitura do presente artigo de Arendt.

Próximo artigo a ser comentado dentro de duas postagens: Perspectivas Sobre a Questão Alemã, mesma obra e mesma editora.

terça-feira, 16 de março de 2010

Livros para Baixar

         Essa semana foi pedido que eu deixasse Links para baixar livros de Arendt. Claro que sou partidário total da compra de livros mas, em tempos que as vezes as condições financeiras não permitam fazê-lo, penso que devemos procurar outros meios. Justificado, passo o seguinte link que contém muitas e muitas obras:
http://search.4shared.com/network/search.jsp?sortType=1&sortOrder=1&sortmode=2&searchName=Hannah+Arendt&searchmode=2&searchName=Hannah+Arendt&searchDescription=&searchExtention=&sizeCriteria=atleast&sizevalue=10&start=0

Abração a Todos e Boa Semana!

quarta-feira, 10 de março de 2010

Biografia III

Saudações Filosóficas!
         
        Justifico aqui os principais motivos que me fizeram deixar de postar regularmente: o primeiro é a necessidade de terminar de ler uma biografia de Hannah Arendt; o segundo a leitura de Edmund Husserl e a leitura de mais dois textos de Arendt que me ajudaram a aprofundar as questões que levantei sobre o artigo A Imagem do Inferno no post anteior e que irei comentar no post de hoje.

I – Biografia III

          O romance de Arendt com Heidegger inicia-se no ano de 1924, quando ela, com 18 anos, entra para a Universidade de Marburg, no meio dos neo-kantianistas “puros”. Heidegger, que fora aluno de Edmund Husserl, já é um professor e filósofo de grande notoriedade: diziam que era um grande orador e que vestia roupas extravagantes. Junto com Karl Jaspers começa a vislumbrar um projeto ambicioso: a reanimação da filosofia. Certamente foi pelo intermédio de Ernst Grumash, seu namorada, digamos assim, que Hannah conheceu o professor Martin Heidegger. Ou seja, seus cursos de filosofia.
         
        Foi no outono desse mesmo ano que Arendt e Heidegger tiveram seus primeiros contatos amorosos. Através, principalmente da poesia, que o amor incandescente entre os dois é representado. No texto autobiográfico Sombras (possível de ser lido nas Correspondências entre Hannah e Heidegger) é possível perceber o quanto esta relação transforma Hannah por completa. Se antes dúvidas tomavam conta de sua existência, agora, ela saberá como lidar com elas e dar-lhes novo significado e sentido.  

          Heidegger nunca falará com seu amigo Jaspers sobre sua relação com Hannah Arendt. Talvez mesmo aí já apareçam alguns traços de sua personalidade: arrogância e arrivismo. Segundo o que temos notícia, através das correspondências entre os dois amantes, Hannah significou a redescoberta do gosto da vida e pelo ensino. Curiosamente em suas correspondências com Jaspers fala que seus alunos são inteligentes e possuem a mente aguçada. Ao que meses antes afirma que os alunos são superficiais e presunçosos.

          Hannah confessa a Hans Jonas, seu amigo na época, que foi em uma noite, no escritório do professor Heidegger que sua história de amor começou. Hans Jonas comenta, lembrando dessa época, que Heidegger parecia, por vezes, um guru: aquele que tudo sabia. A atmosfera que reinava era um tanto quando estranha, pois o encantamento que pode ser exercido é uma faca de dois gumes. Isto porque um aluno de Heidegger se suicida depois de três anos dessa brincadeira de adivinhações.

          Obviamente Heidegger que manter Hannah como sua, em todos os sentidos que nisso possa aparecer. Ele já consta como um “garanhão” e sua esposa não desconhece sua fama. Heidegger está com 33 anos e Hannah com 18. A maturidade desta surpreende aos poucos Heidegger. Em todos os momentos dessa relação Heidegger vê a si próprio como alguém que irá possibilitar a Hannah crescimento: como mulher e como intelectual. As montanhas são os encontros preferidos dos enamorados. Não pela natureza em sim, claro, mas pela discrição. Afinal, ele é casado e já possui filhos.
         
        Gostaria de me estender o máximo sobre o romance dos dois, mas tentarei ser, ao longo dos posts, sucinto. Certamente questões podem ser levantadas e aprofundadas, mandem sugestões.

II – Estudo Comentado

       Comentário do texto: A Imagem do Inferno de Hannah Arendt. Parte I.

        Não pude ler comentadores específicos do texto em questão. Se alguém puder indicar algum comentador específico, ficaria agradecido! Bem, vamos aos pontos que achei interessante mencionar (recapitulando): o problema da própria compreensão da natureza dos crimes e do estado totalitário; a questão da culpabilidade; a diferença entre crimes de estado, guerra e contra a humanidade; a questão da técnica e da ciência quando utilizadas com fins políticos; da ideologia e do terror; do poder.

          “Poderá exigir-se justificadamente aos judeus, acusadores solenes do povo alemão perante o tribunal do mundo civilizado, que elaborem... um libelo (exposição articulada do que pretende se provar contra um réu) em regra. A coisa é fácil de fazer... O sangue das vítimas de Hitler grita e irrompe do chão que o soterra. O objetivo desse documento é formular o sentido desse grito”(ARENDT, Hannah. A Imagem do Inferno. Compreensão e Política e outros Ensaios. Editora relógio D'Água. p. 116). O chamado Livro Negro deveria contar a história do que aconteceu nos últimos dez anos (anterior a 1945) para que se pudesse provar a culpabilidade do povo alemão frente ao que aconteceu ao povo judeu. Arendt comenta o Livro Negro e, ao nosso ver, já com a desconfiança de que não fora somente um crime contra um povo, mas sim contra a prórpria humanidade. Mais que isso, o próprio problema da compreensão do que aconteceu se coloca de forma derradeira para Arendt.

          Foi justamente por falta de compreender e elucidar os os fatos que levaram ao Holocausto (termo que suscitará estudo mais a frente), que o chamado Livro Negro é um fracasso. Um dos traços marcantes do sistema totalitário foi a intensificação do terror (tema que será um conceito e subtítulo de Origens do Totalitarismo alguns anos depois) e as próprias condições humilhantes: “as pessoas morriam como gado, como coisas que não tivessem corpo nem alma, ou sequer um rosto que a morte marcasse com seu selo. É nessa igualdade monstruosa, sem fraternidade nem humanidade – uma igualdade que poderia ter sido compartilhada pelos cães e gatos - que se vê, como se nela se refletisse, a imagem do Inferno”(p. 117).

       Tanto a perversidade dos criminosos, como a inocência das vítimas transcendem as capacidades de compreensão humanas para Arendt. O que não impede a compreensão dos fatos. A perversidade que estabeleceu uma igualdade suprema é tão difícil de compreender quanto uma pena para um crime que excede da mesma forma a justiça humana. As câmaras de gás não possuem uma compreensão ou uma explicação aceitável. Mas é justamente aí, no inaudito, que é preciso lançar mão da própria compreensão. Arendt nesses textos iniciais busca, de alguma forma, demonstrar o caráter de novidade do totalitarismo, da quebra da tradição, da quebra entre o passado e o futuro. Conceitos que se tornarão chaves para compreender o pensamento da autora.
          Continua.