quarta-feira, 10 de março de 2010

Biografia III

Saudações Filosóficas!
         
        Justifico aqui os principais motivos que me fizeram deixar de postar regularmente: o primeiro é a necessidade de terminar de ler uma biografia de Hannah Arendt; o segundo a leitura de Edmund Husserl e a leitura de mais dois textos de Arendt que me ajudaram a aprofundar as questões que levantei sobre o artigo A Imagem do Inferno no post anteior e que irei comentar no post de hoje.

I – Biografia III

          O romance de Arendt com Heidegger inicia-se no ano de 1924, quando ela, com 18 anos, entra para a Universidade de Marburg, no meio dos neo-kantianistas “puros”. Heidegger, que fora aluno de Edmund Husserl, já é um professor e filósofo de grande notoriedade: diziam que era um grande orador e que vestia roupas extravagantes. Junto com Karl Jaspers começa a vislumbrar um projeto ambicioso: a reanimação da filosofia. Certamente foi pelo intermédio de Ernst Grumash, seu namorada, digamos assim, que Hannah conheceu o professor Martin Heidegger. Ou seja, seus cursos de filosofia.
         
        Foi no outono desse mesmo ano que Arendt e Heidegger tiveram seus primeiros contatos amorosos. Através, principalmente da poesia, que o amor incandescente entre os dois é representado. No texto autobiográfico Sombras (possível de ser lido nas Correspondências entre Hannah e Heidegger) é possível perceber o quanto esta relação transforma Hannah por completa. Se antes dúvidas tomavam conta de sua existência, agora, ela saberá como lidar com elas e dar-lhes novo significado e sentido.  

          Heidegger nunca falará com seu amigo Jaspers sobre sua relação com Hannah Arendt. Talvez mesmo aí já apareçam alguns traços de sua personalidade: arrogância e arrivismo. Segundo o que temos notícia, através das correspondências entre os dois amantes, Hannah significou a redescoberta do gosto da vida e pelo ensino. Curiosamente em suas correspondências com Jaspers fala que seus alunos são inteligentes e possuem a mente aguçada. Ao que meses antes afirma que os alunos são superficiais e presunçosos.

          Hannah confessa a Hans Jonas, seu amigo na época, que foi em uma noite, no escritório do professor Heidegger que sua história de amor começou. Hans Jonas comenta, lembrando dessa época, que Heidegger parecia, por vezes, um guru: aquele que tudo sabia. A atmosfera que reinava era um tanto quando estranha, pois o encantamento que pode ser exercido é uma faca de dois gumes. Isto porque um aluno de Heidegger se suicida depois de três anos dessa brincadeira de adivinhações.

          Obviamente Heidegger que manter Hannah como sua, em todos os sentidos que nisso possa aparecer. Ele já consta como um “garanhão” e sua esposa não desconhece sua fama. Heidegger está com 33 anos e Hannah com 18. A maturidade desta surpreende aos poucos Heidegger. Em todos os momentos dessa relação Heidegger vê a si próprio como alguém que irá possibilitar a Hannah crescimento: como mulher e como intelectual. As montanhas são os encontros preferidos dos enamorados. Não pela natureza em sim, claro, mas pela discrição. Afinal, ele é casado e já possui filhos.
         
        Gostaria de me estender o máximo sobre o romance dos dois, mas tentarei ser, ao longo dos posts, sucinto. Certamente questões podem ser levantadas e aprofundadas, mandem sugestões.

II – Estudo Comentado

       Comentário do texto: A Imagem do Inferno de Hannah Arendt. Parte I.

        Não pude ler comentadores específicos do texto em questão. Se alguém puder indicar algum comentador específico, ficaria agradecido! Bem, vamos aos pontos que achei interessante mencionar (recapitulando): o problema da própria compreensão da natureza dos crimes e do estado totalitário; a questão da culpabilidade; a diferença entre crimes de estado, guerra e contra a humanidade; a questão da técnica e da ciência quando utilizadas com fins políticos; da ideologia e do terror; do poder.

          “Poderá exigir-se justificadamente aos judeus, acusadores solenes do povo alemão perante o tribunal do mundo civilizado, que elaborem... um libelo (exposição articulada do que pretende se provar contra um réu) em regra. A coisa é fácil de fazer... O sangue das vítimas de Hitler grita e irrompe do chão que o soterra. O objetivo desse documento é formular o sentido desse grito”(ARENDT, Hannah. A Imagem do Inferno. Compreensão e Política e outros Ensaios. Editora relógio D'Água. p. 116). O chamado Livro Negro deveria contar a história do que aconteceu nos últimos dez anos (anterior a 1945) para que se pudesse provar a culpabilidade do povo alemão frente ao que aconteceu ao povo judeu. Arendt comenta o Livro Negro e, ao nosso ver, já com a desconfiança de que não fora somente um crime contra um povo, mas sim contra a prórpria humanidade. Mais que isso, o próprio problema da compreensão do que aconteceu se coloca de forma derradeira para Arendt.

          Foi justamente por falta de compreender e elucidar os os fatos que levaram ao Holocausto (termo que suscitará estudo mais a frente), que o chamado Livro Negro é um fracasso. Um dos traços marcantes do sistema totalitário foi a intensificação do terror (tema que será um conceito e subtítulo de Origens do Totalitarismo alguns anos depois) e as próprias condições humilhantes: “as pessoas morriam como gado, como coisas que não tivessem corpo nem alma, ou sequer um rosto que a morte marcasse com seu selo. É nessa igualdade monstruosa, sem fraternidade nem humanidade – uma igualdade que poderia ter sido compartilhada pelos cães e gatos - que se vê, como se nela se refletisse, a imagem do Inferno”(p. 117).

       Tanto a perversidade dos criminosos, como a inocência das vítimas transcendem as capacidades de compreensão humanas para Arendt. O que não impede a compreensão dos fatos. A perversidade que estabeleceu uma igualdade suprema é tão difícil de compreender quanto uma pena para um crime que excede da mesma forma a justiça humana. As câmaras de gás não possuem uma compreensão ou uma explicação aceitável. Mas é justamente aí, no inaudito, que é preciso lançar mão da própria compreensão. Arendt nesses textos iniciais busca, de alguma forma, demonstrar o caráter de novidade do totalitarismo, da quebra da tradição, da quebra entre o passado e o futuro. Conceitos que se tornarão chaves para compreender o pensamento da autora.
          Continua.

4 comentários:

  1. Estou adorando o blog. Hanna Harendt me encanta completamente.

    Parabéns pela iniciativa!


    Acho que você pode tentar contato com o Gabriel Chalita. Uma vez assisti uma palestra dele e ele falou muito sobre ela. Acredito que ele possa te ajudar bastante.
    Tente falar com ele pelo twitter gabriel_chalita.

    Beijos.

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  2. Natália! Nossa! muito obrigaduuuuu! Fico realmente feliz que estejas gostando! FOi tentar sim um contato pelo Twitter, que ainda não tenho. Abração!

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  3. SEUS COMENTÁRIOS SOBRE HANNAH, ESTÃO A AJUDAR-ME BASTANTE. A MINHA MONOGRAFIA VERSARÁ SOBRE O CONCEITO DE PODER POLITICO EM HANNAH ARENDT. OBRIGADO PELA DICA
    !

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  4. Cristian, tudo bem? Pesquisando sobre Arendt cheguei aqui. Gostaria que você me indicasse biografias da filósofa em português. Há alguma melhor biografia? As traduções para o português estão boas? Vi uma crítica sobre esta (http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs231116.htm) e, por isso, resolvi perguntar-lhe então sua orientação. Abraços.

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