quarta-feira, 28 de abril de 2010

Discussão de Textos

              Como citado anteriormente, li dois artigos de Gérard Lebrun sobre Hannah Arendt. Grande autor! Com uma linguagem clara e de impressionante acuidade com as palavras. Reproduzo aqui os últimos parágrafos do artigo: A Liberdade Segundo Hannah Arendt (deixo a bibliografia logo após a citação). Lebrun elogia e inclusive diz ter por ela admiração, mas não deixa de lado a fidelidade para consigo mesmo e desprende uma crítica ferrenha a maneira que Arendt trata os conceitos de liberdade e política. É é justamente a estas críticas que gostaria de colocar em discussão. Aguardo comentários!!!
Na íntegra, segue os trechos finais do artigo:


                         “Mas tendo em vista que tipo de subversão esta crítica se coloca? A serviço de que esta arqueologia corrosiva? É quando tenta dar um conteúdo positivo à 'vida ativa' que perdemos que Hannah Arendt me desconcerta. Assim quando Celso Lafer nota que ela 'vê (a liberdade) como forma de ação que se dá na pluralidade do espaço público da palavra e da ação, como fruto da criatividade original de casa ser humano', não consigo imaginar a cena nem o cenário desde 'mundo público' ideal. De onde provém, pois, esta minha miopia?”.
                     “O que me perturba é que o contramodelo antigo é perpetuamente contraposto ao da comunidade política moderna. H. Arendt detesta a ideologia que confina a 'liberdade' à vida privada, e a partir daí, reduz a instância política a ser apenas o aparelho de proteção da 'esfera das necessidades'. Mas que visão do político nos propõe ela em troca?... Um domínio ode a preocupação para com a vida perdeu sua validade e deve ceder lugar à preocupação com 'a liberdade do mundo'. 'Em política, não a vida, mas sim o mundo é que está em jogo'. Nobres Palavras, mas que não impedem o político e o econômico, hoje, de se manterem indissociáveis. Não há programa político que não seja julgado em primeiro lugar sobre a pertinência das soluções econômicas que ele propõe. Não existe mais um discurso político que possa seriamente convidar os homens a abandonar sua preocupação com a segurança e o bem-estar”.
                      [...] “Estas linhas nostálgicas não nos convidam a desconhecer que Hobbes não fala mais da mesma coisa que Aristóteles? Como poderíamos falar de um poder político gestionário e 'governamentalizado', utilizando os conceitos que serviam para descrever uma simples 'comunidade'? Como, nesses dois contextos, a palavra liberdade poderia guardar qualquer raiz comum?"
                            "Não vejo que utlilidade poderia ter hoje a referência a um initium fundador da cidade, ao menos fora das ideologias totalitárias. É por isso que acho fraca, no final das contas, a análise crítica do fenômeno totalitário por Hannah Arendt. Ela abstrai o fato de que o totalitarismo retomou (mesmo que de maneira caricatural) os temas post-kantianos de 'cidade ética', do universal concreto, etc. Ela não pergunta porque a razão clássica foi a grande provedora da desrazão ideológica de nosso século. É que a essa razão clássica, Hannah Arendt estava tão ligada quanto continua Habermas. Dialogar no 'espaço público', pensar em comum e se situar cada um no ponto de vista de todos os outros, esses temas kantianos, retomado por eles, bastam para mostrar que as duas obras têm a mesma fonte. Arendt, como Habermas, não nos faz deixar o terreno do universalismo e dos filósofos do sujeito ampliado. Os dois são epígonos do 'grande racionalismo'”.
                         “Mas é de se temer que sejam também testemunhos de sua impotência para fomentar um pensamento político vivo. O belo sonho de uma comunidade transparente, de uma comunicação sem travas, representa mais do que nunca o ideal da razão – não somente incessível, mas anacrônico. Gostaríamos, sem dúvida, de ser arendtianos (como gostaríamos de levar a sério as homilias do papa). Gostaríamos que a liberdade fosse 'o motivo porque os homens convivem politicamente organizados'. Mas como não recuar diante da teleologia idealista que pressupões essa afirmação? Como não pensar que o homem não se tornará mais (se é que algum dia o foi) o 'animal racional' capaz de satisfazer a esse ideal?”.

LEBRUN, Gérard. Passeios ao Léu. Brasiliense: 1983 (pg 56-59)

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